A alegação de que Deus permite o canibalismo é verdadeira?
Bem, o canibalismo era praticado por várias culturas naquelas épocas (e hoje ainda é PR algumas mais primitivas). De fato o canibalismo ocorreu no meio dos judeus, muitas são as passagens bíblicas que relatam estes fatos horripilantes e tristes. Mas foram provocados ou incentivados por Deus?
Vejamos algumas passagens:
Deuteronômio 28:53:
“Por causa do sofrimento que o seu inimigo infligirá sobre vocês durante o cerco, vocês comerão o fruto do seu próprio ventre, a carne dos filhos e filhas que o Senhor, o seu Deus, deu a vocês.”
Levítico 26:29: “Vocês comerão a carne dos seus filhos e das suas filhas.”
2 Reis 6:27-29: “… Ela respondeu: “Esta mulher me disse: ‘Vamos comer o seu filho hoje, e amanhã comeremos o meu’. Contudo ele perguntou: “Qual é o problema?” Então cozinhamos o meu filho e o comemos. No dia seguinte eu disse a ela que era a vez de comermos o seu filho, mas ela o havia escondido”.
Lamentações 2:20: "Olha, Senhor, e considera: A quem trataste dessa maneira? Deverão as mulheres comer seus próprios filhos, que elas criaram com tanto amor? Deverão os profetas e os sacerdotes ser assassinados no santuário do Senhor?
Ezequiel 5:10: “… os pais comerão os seus próprios filhos, e os filhos comerão os seus pais…”
Há nelas um elemento em comum: o canibalismo como fruto de momentos de extrema adversidade, como uma cidade em estado de fome devido está sitiada por algum inimigo em uma guerra. Esse ato de desespero foi promovido por pais e mães diante de uma fome extrema e um desespero sem medida.
No mundo animal, ao qual nos incluímos, não é raro que algo absurdo e macabro como comer um ente querido ou um da mesma espécie diante de situações extremadas de fome, ocorra. Lembremos do caos dos sobreviventes da queda do avião nos Andes onde os 16 sobreviventes, integrantes de um time de rúgbi, tiveram que se alimentar dos corpos de seus parentes e amigos para ter qualquer chance de sobreviver até o resgate, que demorou dois meses.
Sobreviventes do acidente no Andes que para não morrerem de fome cometeram canibalismo com seus amigos falecidos.
Porém existe uma passagem que, segundo a interpretações de alguns, revela o desejo de Deus de promover tal ato insano no meio do seu povo:
Jeremias 19:9: “Eu farei com que comam a carne dos seus filhos e das suas filhas; e cada um comerá a carne do seu próximo, por causa do sofrimento que os inimigos que procuram tirar-lhes a vida lhes infligirão durante o cerco.”
A frase “eu farei com que comam a carne de seus filhos” é atribuída a Deus, e portanto, seria uma constatação de que Ele aprovaria este ato macabro e que incutiria neles o desejo em pratica tal ato.
È, no entanto, para um não crente, difícil perceber e aceitar que tudo possa ser passível de controle por Deus, também as calamidades poderiam ser evitadas por Ele. Eu disse “poderiam”. Então, quando algo de ruim ocorre para com um povo como resultado natural de suas transgressões, essas conseqüências poderiam ser evitadas ou cessadas diante do desejo de Deus. Mas, o mistério da intervenção do divino só ocorre no momento em que Ele deseja, e quando não ocorre, os resultados finais negativos também são atribuídos a Ele. Não por seu desejo, mas por sua não atuação em contrário. Para valorizar o livre arbítrio, que nos torna seres livres (caso o contrário não passaríamos de cobaias ou fantoches nas mãos de um ser sádico) Deus permite que possamos viver plenamente neste mundo, passando por todas as situações agradáveis e também por situações adversas, interferindo ele no momento em que deseja promover algo de Sua vontade. Um pai (e Deus é pai), por exemplo, nem sempre vai proibir seu filho de ir a algum lugar considerado perigoso. Ele terá que um dia permitir que seu filho aprenda sobre a vida também correndo riscos, até mesmo de morrer, para que tenha sua liberdade de viver garantida. Procurar entender e julgar quando devem ocorrer essas intervenções é uma premissa que não nos cabe.
Conclusão: O canibalismo contra os filhos exposto nos textos bíblicos não é uma ação promovida por um ser divino, mas, a conseqüência de uma situação extremada, onde diante de uma fome que ameaçava a vida, os pais sobreviventes, em um ato de desespero, comeriam a carne dos seus filhos recém falecidos.
