
Quem foi Lilith?
Na cultura oral hebraica e no seu esoterismo, representado pela Cabalá, existe uma personagem chamada Lilith que também foi criada da mesma forma que Adão, mas, com a utilização de lodo e fezes (materiais impuros que nos remetem à malignidade do novo ser). Criados com o propósito de cuidar e proteger o ambiente denominado de Jardim do Éden, eles formavam um casal normal, até então. Porém, Lilith se rebela por considerar a relação que tinha com Adão um sinal de submissão: "Por que devo deitar-me embaixo de ti? Por que devo abrir-me sob teu corpo? Por que ser dominada por ti? Contudo eu também fui feita de pó e por isso sou tua igual" (Segundo o Alfabeto de Ben Sirá, século VI ou VII). Adão tinha sempre a última palavra e Lilith se sentia subordinada até mesmo nos momentos sexuais, onde Adão sempre estava por cima. Lilith questiona o “Criador” em relação a essa situação e este lhe dá duas opções: submeter-se a Adão ou sair do jardim do Éden. Ela então sai para uma região próxima ao Mar Vermelho, onde habitavam demônios. Assim, o “Criador”, diante da solidão de Adão, resolve criar uma mulher de uma das suas costelas. Essa sim seria totalmente submissa a ele.
De acordo com a Torá e o Midrash (escrituras hebraicas), Lilith se mostrou para o seu companheiro Adão, coberta de sangue e saliva. Rabi Yehuda explica: “O princípio a criou, mas quando o homem a viu cheia de saliva e de sangue afastou-se dela, tornou a criá-la uma segunda vez, como está escrito: ‘Desta vez. Esta e aquela da primeira vez’. A mulher da primeira vez é Lilith, que provoca em Adão uma sensação angustiante, que lhe amedronta. O sangue mencionado na citação acima sugere a menstruação, uma característica carnal e instintiva da mulher, além da ausência de pudor e tabus de Lilith, que se apresenta livremente ao homem, disposta também à experiência sexual no ciclo menstrual. A saliva reforça o caráter sexual simbólico, remetendo a uma ideia de secreções eróticas. Deste modo, fica evidente a condição sensual e libertada dos preconceitos dentro do universo simbólico feminino em Lilith; é essa atuação sexual, que leva o homem ao êxtase e fora do controle sobre si mesmo, o que amedronta o universo simbólico masculino expressado em Adão: por isto, ele se afasta e busca uma companheira adequada – ou seja, submissa, obediente, que sinta-se inferior”. Com o respeito adequado, discordo em parte do pensar do Rabi Yehuda, já que quem se afasta é Lilith e não Adão.
Nas proximidades do Mar Vermelho, Lilith se envolve com seres demoníacos a tal ponto de se transformar em um deles. O demônio Samael, que, nas tradições judaicas é identificado como o Anjo da Morte, o anjo que lutou com Jacó (Gênesis 32:24-31) e o anjo que segurou o braço de Abraão no momento do sacrifício de Isaque (Gênesis 22:1-13) e que também no esoterismo cabalista é descrito como a "ira de Deus”, se torna seu parceiro e eles geram milhões de demônios. Diz a lenda que Lilith gerava cem demônios por dia, esses pequenos seres demoníacos eram denominados de Liliotes ou Linilins. A poligamia era regra entre eles e Samael possuía além de Lilith três outras esposas: Aggarath, Mochlath e Nehemah. Para os cabalistas Nehemah e Lilith eram as duas rainhas do inferno.
Eles acreditam que quando um homem é infiel recebe à noite durante o sono a visita de Nehemah, que o seduz e tem relações com ele, ficando grávida. No entanto, ela entrega seus filhos para que Lilith os devore. Esses seres demoníacos que têm relações sexuais em um plano metafísico durante uma situação de sono profundo e que geram seres espirituais, são denominados de súcubos (forma feminina) e íncubos (forma masculina). As culturas assíria, babilônica e hebraica afirmam que tais seres também podem gerar seres físicos, híbridos entre o humano e o demoníaco. Os índios Tupi possuem em suas lendas a entidade Jurupari que muito se assemelha aos Íncubos das culturas mesopotâmicas. Lilith não é encontrada no Alcorão ou Haddith, no entanto, o escritor sufi Ahmad al-Buni, em seu Shams al-Ma’arif al-Kubra (Sol do Grande Conhecimento) menciona um demônio chamado a “mãe dos filhos” que provavelmente se refere a Lilith.
Segundo o rabi Eliezer, Lilith seduziu Adão e Samael (que significa “veneno” [Sam] “de Deus” [El]) e também é chamado de “o acusador”, “o sedutor”, “deus-cego” e “o destruidor”), foi o encarregado de tentar Eva, e foi bem sucedido, engravidando-a de Caim. O Talmude menciona isso assim: "Quando a serpente se envolveu com Eva, atirou-lhe a mácula cuja infecção foi transmitida a todos os seus descendentes... (Shabbath, fol. 146, recto)". Adão também teria engravidado Eva logo em seguida (de Abel). Essa situação de uma mulher engravidar de dois “homens” ao mesmo tempo é tecnicamente possível e é denominada cientificamente por Superfecundação Heteropaternal. Desta forma Eva já estaria grávida quando eles foram expulsos do Jardim do Éden: Gênesis 3:15-16 “15 E porei inimizade entre ti e a mulher, e entre a tua semente e a sua semente; esta te ferirá a cabeça, e tu lhe ferirás o calcanhar. 16 E à mulher disse: Multiplicarei grandemente a tua dor, e a tua conceição; com dor darás à luz filhos; e o teu desejo será para o teu marido, e ele te dominará”. A Lilith também foi atribuída culpa pela desavença entre Caim e Abel.
De acordo com Gershom Scholem, o autor do Zohar, o rabino Moisés de Leon (Espanha, 1250-1305) conhecia amplamente a tradição popular sobre Lilith e outras histórias peculiares, como a de que existiam dois espíritos femininos, Lilith e Naamah, que desejavam a beleza de Adão, que era comparada com a do disco solar (????). Lilith e Naamah se envolveram sexualmente com Adão e tiveram filhos espirituais (demônios) que ficaram conhecidos como “as pragas da humanidade”.

